Quando eu tinha seis anos, na primeira série, anunciei em casa na maior tranquilidade: tem um menino na minha sala que é
bicha. Meus pais arregalaram os olhos e me deram um longo sermão sobre Deus ter
criado homens e mulheres. Eu não vi nada demais em falar. Era como se eu tivesse
falado que tem um menino na minha sala japonês ou que tem um ruivo.
Até parece que eu não sabia ainda que existem bichas no
mundo. Claro que eu sabia. Achei estranha a postura dos meus pais. Diante do
que eu contei e a partir do comportamento deles com outros assuntos, eu
esperava que eles dissessem algo do tipo:
- Como você sabe que ele é bicha? Você não chama ele de
bicha, não é? Se os meninos tratarem ele mal, conte pra professora.
Era assim que meus pais eram, acolhedores e defensores da
justiça. Mas porque agiram diferente em relação a isso?
Só mais tarde eu fui entender. Eu, bom menino e gentil com quase
todo mundo, era delicado demais e na visão deles, podia “desviar” meu caminho.
Mas fui educado por eles mesmos para ser pacifista, polido e gentil. Era como
se eles estivessem me reprogramando: seja doce, mas seja homem.
Com ele eu só brinquei de apostar corrida no pátio da escola.
Percebi que na hora de tocar no poste e voltar ele tinha toda uma elasticidade
diferente. A tal da malemolência.
Só entendi a preocupação dos meus pais mais tarde na
adolescência, quando eu estava verde demais pra me defender de brincadeiras com
empurrões e cuspe. Voltando à primeira série, sem saber o que fazer depois de
um sermão tão longo, deixei de brincar com o menino.
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