quinta-feira, 5 de junho de 2014

Olá, Terra. Sou eu de novo.

Nesta semana, astrônomos descobriram um exoplaneta rochoso gigante, isso é exótico porque planetas rochosos são geralmente pequenos como a Terra, os gigantes são gasosos. Ele orbita uma estrela parecida com o Sol. 
Antes disso, quando a NASA descobriu o primeiro planeta parecido com a Terra, os astrônomos convidaram Alastair Reynolds, autor de ficção científica a escrever algo inspirado na descoberta. Aí está o conto, traduzido por mim.


Olá, Terra. Sou eu de novo.

        Eu espero que você esteja recebendo meu sinal alto e claro.

Você vai ficar feliz em saber que eu estou ligado após os longos séculos de minha fase de cruzeiro interestelar. Após executar uma verificação completa de saúde, posso confirmar que todos os meus equipamentos estão funcionando normalmente. Melhor do que normalmente, verdade seja dita. Correndo o risco de imodéstia, eu estou realmente em excelente forma. Propulsão, processadores, sensores de longo alcance, navegação e comunicação - Eu não poderia estar em melhores condições.
Nada mal para uma peça de hardware espacial que já visitou seis sistemas solares, sem nunca precisar voltar para casa. Claro, eu não posso dar o crédito para mim mesmo. Eu fui bem fabricado - construído para durar por milhares de anos. Mesmo assim, obrigado por me fazer.
Eu não posso deixar de dizer o que encontrei aqui em torno da estrela de Kapteyn. Isso realmente é um lugar extraordinário - um sistema solar diferente de todos que eu já visitei. Eu gostaria que você pudesse estar aqui comigo, ver as coisas através dos meus olhos.
Eu cavei fundo em meus arquivos e entendo por que você me enviou a estrela Kapteyn. Ao contrário dos outros sistemas que visitei, este sol e sua pequena família de mundos não fazem parte das famílias normais de estrelas que orbitam no disco e bojo da galáxia. Esta é uma estrela de halo - um membro de uma população dispersa de estrelas e aglomerados de estrelas, encerrando a Via Láctea em uma grande esfera fina. É inteiramente possível que essas estrelas não fossem originalmente parte de nossa própria galáxia, mas foram lançadas livres de uma para outra, após uma espécie de colisão gravitacional. E algumas dessas estrelas são incomensuravelmente velhas - mais antigas e admiráveis, talvez, do que qualquer estrela do disco da galáxia.
A estrela de Kapteyn está queimando tão lentamente, que até mesmo meus instrumentos não podem avaliar a sua idade máxima. Poderia ser quase tão antiga quanto o Universo. E os seus planetas? Tão velhos quanto ela.
Use isso como quiser – tire da programação se não servir - mas eu sinto a idade deste lugar em meus ossos. Tudo bem, na minha placa-mãe. Eu não tenho os ossos, sei disso. Mas acredite em mim, este sistema me faz sentir realmente assombrado. O silêncio e a quietude são quase insuportáveis, como uma pressão sem fim, crescendo. Nada aconteceu aqui por voltas inteiras da galáxia; nada vai acontecer. A estrela de Kapteyn ferve, queimando a sua vida nuclear. Os mundos mortos parasitam ao redor com suas órbitas mortas.
Mas há um tempo, havia algo.
Eu sei, eu tenho tomado liberdade. Eu deveria ter transmitido meu sinal de “ligado” antes de fazer qualquer investigação. Mas eu não pude resistir a mim mesmo. Você me fez curioso.
Eu encontrei sinais de civilização.
O primeiro planeta – Kapteyn-b - ainda está dentro da zona habitável da estrela, que orbita uma vez a cada 48 dias. Não há nada que viva lá agora, nem mesmo atmosfera, mas um dia houve uma cultura tecnológica.
Sim, a primeira que eu encontrei. Esse foi o motivo de me construírem. Que tal essa descoberta?
O fato é que não foi difícil de detectar. Cidades cobriram quase toda a superfície do mundo. Estruturas enormes - elas devem ter alcançado o espaço! Pratos e torres e os restos do que eu penso que devem ter sido elevadores espaciais, subindo até a órbita síncrona. A sua lua tem a superfície coberta pelos mesmos tipos de construções. Tem evidências de colonização no segundo planeta, Kapteyn-c, na sua órbita mais fria.
Maravilhas sem comparação, mas em uma espécie de uniformidade cinza sepulcral, após eras de micrometeoritos e bombardeio de raios cósmicos. Cidades mudas como esfinges. E em nenhum lugar o menor sinal de vida.
Crateras do tamanho de continentes marcam Kapteyn b e me pergunto se elas contam sobre alguma catástrofe impressionante - um acidente cósmico, ou algo pior? Seja qual for o caso, os construtores dessas cidades estão muito longe. Talvez eles estivessem mortos antes mesmo que a estrela de Kapteyn tivesse sido arrancada das garras de sua galáxia mãe.
Correndo o risco de inferir muito a partir de poucos dados, eu não posso deixar de ceder a um pouco de especulação. Eu também sou o produto de uma civilização tecnológica, com a capacidade de transformar um planeta para colonizar outras luas e mundos, para construir estruturas assustadoras. O povo de Kapteyn-b era claramente mais avançado do que vocês, meus próprios construtores, mas com o tempo, você também poderia ter transformado um mundo desta maneira.
Algo para pensar, não é?
Bem, preciso encerrar a transmissão agora. Eu vou explorar um pouco mais deste sistema e talvez soltar alguns pacotes de instrumentos para baixo em Kapteyn b. Vai haver um risco, uma vez que eu vou ter de entrar em uma órbita bastante próxima e quem sabe o que vai acontecer? Ainda assim, isso é um perigo que eu estou preparado para aceitar. Você me fez para isso, e eu sou grato por tudo o que eu tenho permissão para ver e fazer.


Mas olhe. Eu sei que é uma coisa pequena, e eu realmente não devo incomodá-lo sobre isso. Mas tem sido um longo tempo desde que eu me comuniquei com você. Sim, empenhei um grande esforço para estas transmissões e seria bom - apenas uma vez - saber se há alguém do outro lado, ouvindo. Apenas uma palavra, deixe-me saber que você ainda se importa.

Um comentário:

  1. Muito interessante. Esse encantamento pelo universo, pelo conhecimento me fascina. Além disso, o arremate acontece de um jeito bastante inusitado, a busca pela interação, por qualquer q seja a resposta. Isso me lembrou de "her".

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